quarta-feira, 9 de março de 2011

Somente Só


A porta bate, aparentemente de forma mais violenta que o normal.

- És tu Joan?
- Sim sou, quem mais teria chaves para entrar? Que pergunta idiota...
- E agora só podes entrar numa casa se tiveres a chave? Ainda dizem que novidades só no continente, os assaltantes vão-se juntar ao resto do país, à crise.
- A sério? E a pergunta que fizeste antes era para o assaltante te responder? Põe um pratinho com bolachas e leite para os acolher melhor!
- E moderares essa arrogância, foi uma pergunta perfeitamente normal. Não sei que te está a dar hoje.
- Fui despedida, estás contente?
- Despedida? Como assim despedida?
- Não entendes? D-E-S-P-E-D-I-D-A, fiquei sem emprego, sem trabalho, sem forma de nos sustentar, sem ordenado, sem justificação que te possa dar.
- Mas porquê? Como assim sem justificação para me dar? O que aconteceu?
- Não existe justificação. Tenho toda a culpa do mundo, não tenho coragem para continuar aqui.
- Que pretendes dizer com isso? Explica-te.
- Quero dizer que vou partir, apenas isso.
- Como assim partir? Não sejas idiota, tudo se vai resolver, nada do que possas ter feito pode ser imperdoável.
- Para ti talvez não, nunca achas nada imperdoável, estiveste sempre aí, ainda estás. Já afirmas ter perdoado sem sequer saberes o que fiz, vais estar sempre aí. Mas para mim, é imperdoável, por isso parto.
- Mas isso não resolve nada, porque queres partir?
- Mereces melhor, mas se te descansa não vou partir com outro, apenas irei partir.
- Não me descansa, para onde vais? Como assim partir? Porque me abandonas?
- Um dia irás ter todas as repostas, e esse dia não dista tanto como possas estar a imaginar.
- Pára! Responde-me raios! Não quero dilemas, a minha vida é feita de dilemas, de meias perguntas, meias respostas, de desnorte!
- Mais tarde receberás a explicação, prometo, mas não vinda de mim.
- PORQUÊ? Onde raio queres chegar com isto tudo?
- Deixa-me tomar um banho, não quero discutir contigo, não agora.

Joan entra para a casa de banho, segundos depois ouve-se um estrondo estonteante.

- Que barulho foi esse? Onde estás?

Ao abrir a porta deparo-me com uma imagem que nunca mais perdi. Joan deitada, com o revólver na mão, ainda apontado à cara, já envolvida pelo seu próprio sangue.

- PORQUÊ? O QUE FOSTE FAZER? O QUE FOSTE FAZER?

Repeti aquela pergunta durante horas, e ali fiquei, atordoado, somente só. Nada diferente da forma como ainda me sinto.